O amor não precisa de consolo


O amor é cego, Ray Charles é cego, Steve Wonder é cego e o albino Hermeto não enxerga mesmo muito bem, mas não dá pra fingir não ver um consolo daquele tamanho. Quando meu amor voltou de viagem veio trazendo na bagagem a novidade. Havia comprado um vibrador, um sonho de consumo antigo, travado na ideologia, no falso pudor ou na vergonha de encarar o balconista do sex shop. Tanto tempo de sonho adiado contribuiu para que ele se transformasse em um desejo reprimido, e quando se manifestou veio como a força de água represada. Quando meu benzinho resolveu me mostrar o treco, me deu uma sensação de impotência. Ela passou quase uns cinco segundos para conseguir tirar todo “ele” da sacola. Ela puxava e não parava de sair. A porra tinha o tamanho de uma bisnaga que francês adora carregar embaixo do sovaco. A louca aloprou dessa vez. O consolo devia ter uns trinta centímetros. Depois da sensação de impotência veio uma ponta de raiva originada no ciúme e no complexo do pau pequeno que acompanha todo macho, acho eu. Comecei a tentar ser racional e pensar que meu pau não é tão pequeno assim e que afinal de contas o vibrador poderia ser meu aliado na realização dos desejos sempre insaciáveis do meu amorzinho. Mas toda vez que eu olhava pra “ele”, me sentia um fracasso, amarelava legal, ficava com medo de entrar em campo. Como concorrer com “aquilo”? A louca tinha comprado um consolo enorme, siliconado e preto. Toda mulher branca tem esse fetiche de dar pra um negão de pau grande. Herança atávica da época da avó, sinhazinha da fazenda que pegava geral na senzala. Olhando para o objeto a reflexão que eu fiz era que ela estava com o cara errado. Eu não sou negão e estou longe pra caralho dos trinta centímetros desejados. Daí a sensação de frustração e ciúme. E como participar de um jogo onde aquele monstro entraria em campo primeiro, jogaria o primeiro tempo, e eu só entraria no segundo. Seria como se saísse o Messi e entrasse o Gladstone. Com toda a certeza a torcida vaiaria. Eu teria que dar o sangue que não tenho para concorrer com aquilo. Não tenho mais idade pra correr atrás dos carros como um cachorro otário. Se eu fizer contorcionismos eu tenho distensão muscular. Agora vou ter que dividir meu amor com outro objeto. As chances de ela ir me esquecendo no processo é bem grande. Tenho a impressão que ainda vou vê-la dando beijinhos no bagulho chamando de amor. Tenho que ir no Google e ver se acho um manual de instrução “Como usar vibrador no dos outros” e um livro de auto ajuda “O que fazer quando o consolo lhe deixa desconsolado” e me preparar para sensações novas, estranhas e alienígenas se quiser continuar gozando da presença e da companhia da mulher que em algum momento de loucura escolhi para ser minha. Tenho muito a evoluir. A sorte é que não vai ser em mim que o baguio vai entrar e, se meu amor engravidar as chances de eu ter certeza que o filho é meu vai aumentar muito. Ando com saudades do tempo da Dalila, minha boneca inflável siliconada, aquilo sim é que era mulher.

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